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21 de fevereiro de 2018

[Conto] Thrummaz - o Rei Anão - Parte II

► Veja a Parte I

A armada Khro Rym foi temporariamente rebatizada como a Guarda Pessoal de Thrummaz de Tyrun, rei dos anões. Isto porque agora seus quarenta e cinco guiavam Thrummaz e seu segundo filho, Elger. 

 Agora, esta competente comitiva via-se barrada por cinco cavaleiros de Devilon. 

- Sou o Magistrado Romaz Kype. - Informa ele. - Informe sua identidade e intenção.

Thrummaz adianta-se ao humano jovem e de aspecto ansioso, adornado como um Magistrado - membro de uma das antigas ordens de Yius, Deus da Justiça, que uma autoridade local teria nomeado como julgador e mesmo delegado. Usava a flâmula de Devilon, uma cidade-estado de médio porte já além da Cordilheira do Ouro, consideravelmente próxima da Aliança vassalar de Lyon.

- Magistrado Kype sabe muito bem quem eu sou. - adianta o regente. 

- Quis manter formalidades, majestade. - A explicação parecia mais uma desculpa. Contudo, devotos do Deus da Justiça jamais mentem. 

- As formalidades indicariam que eu fosse recebido no palácio de seu regente, o Coronel Dyomaz, regente de Devilon. Ou ao menos que víssemos seus muros.

- O senhor não deve ir ao Palácio, majestade. - fala enfim o Magistrado, recolhendo a voz. - Eu posso ... escoltar seus homens ao Norte, onde temos um pomar abundante e providenciarei o que precisarem para uma boa estada.

 O capitão Volthrur não consegue esconder um sorriso zombeteiro. Khro Rym era uma força militar bastante para tomar a cidade, e a resistência que encontrou até aquele momento eram cinco humanos a cavalo. Mas mantém o silêncio. Deixou seu rei cuidar das conversas.

- Devo deduzir que alguém está no Palácio... - pondera Thrummaz. - Alguém a quem não seria conveniente nos ver.

Kype não tinha mais rodeios para a informação.

- Esta manhã recebemos uma comitiva do Império Áureo. - Fala enfim. - E não há dúvidas que seu intento é a ... Posse.

- As fronteiras do Império estão muito longe daqui! - Príncipe Elger intervém. - Tem as florestas dos centauros e as pradarias dos minotauros entre eles, e Icátia fecha o contorno no Norte. 

- Dois Minotauros compõem a comitiva que chegou hoje. E trigo dos Centauros alimentam a campanha auriana a Icátia. Eles podem contornar o Bosque do Desespero pelo Norte ou pelo sul, e tudo o que separa seu reino e a capital de Lyon das armas do Império somos pontos de luz como nosso reino e a Marca de Katzoplis. Não é esse o assunto que os trouxeram aqui?

Elger e Volthrur se entreolham com a notícia. Estavam certos que tanto centauros quanto minotauros seriam uma campanha militar de anos para o invasor oriental. Icátia e Devilon agora eram os últimos reinos não-assimilados por Áureo III... Icátia conta com defesas consideravelmente simples e tradição belicosa minguada. Devilon, era um terço do que quer que Icátia fosse.

- Nosso assunto é outro, Magistrado. - Fala o rei. - Aceitamos que minha guarda pessoal acampe fora das vistas dos seus convidados. Mas quero ir com uma carroça visitar um de seus súditos, e estou disposto a ocultar minha identidade, se for do desejo de seus mestres.

- S...Sua compreensão é nobre e de grande consideração, Majestade. - Fala surpreso e incerto o magistrado. - Por favor, sigam-nos ao norte primeiro. De lá, estejam livres para seus assuntos. Só não partam antes de serem adequadamente recebidos pelo Coronel Dyomaz.

 A comitiva seguiu por uma estrada secundária pouco usada, cujas moitas duras começavam a tentar tomar de volta o terreno. Obviamente cruzar a cidade era o mais prático para viajantes rumando ao norte, coisa que não era do intento de Devilon nem da coroa de Tyrun. O rei e seu filho recuaram ao quarto retaguarda, onde uma única carroça era o veículo principal, exigindo cuidado redobrado do destacamento Khro Rym para vencer os obstáculos. Isso devido ao artefato que traziam, enrolado como podiam para ocultar sua silhueta e proteger dos solavancos e intempéries. 

- Senhor meu pai... - sussurra príncipe Elger. - Talvez devêssemos enviar notícias a Lyon e a nosso reino. 

- Hein? - O rei parecia distraído, mas logo se inteira do que falava seu filho. - Sim... sim. Mas nossa missão é sagrada, meu jovem. E considerando Devilon e o Forte das Armas, gente demais sabe de nossa comitiva. Se interceptarem um mensageiro nosso pode criar incógnitas demais.

- Bem... - Ponderava o príncipe dos anões sobre o dever para com seus aliados humanos e a missão. - Daqui retornaremos para Tyrun?

- Vai depender de Gillibrand... - O rei sussurra um nome que o incomodava. O príncipe entende e decide se calar.

(...)

O assentamento improvisado foi levantado em uma clareira de macieiras. Magistrado Kype autorizou o consumo, embora faltasse alguns dias para as frutas estarem aptas para a colheita. Também ditava as leis quanto à caça na região. Thrummaz de Tyrun perdeu essas particularidades, preferindo se preparar para o ingresso em Devilon. Decidira ir acompanhado apenas do príncipe e do capitão Volthrur com a carroça do artefato. Usavam vestes mais simples de couro adquiridas em Odnenga cinco dias antes, mas com peças segmentadas com as flâmulas por baixo para o caso de precisarem se identificar.

 A cidade-estado humana era murada com rocha. Estavam já longe da cordilheira, mas era fácil deduzir que um veio mais irregular estava ao alcance dos primeiros colonizadores humanos que fizeram o reino. Usavam um portão para o norte, menos propicio a viagens muito além dos pomares, o que tornava a passagem discreta. A cidade velha era centrada no castelo, na posição oposta à entrada do pomar. Isso os colocavam em bairros mais residenciais da cidade, o que era conveniente.

 Kype não teve dificuldade em orienta-los ao seu destino, afinal, era um ponto de referência. "A casa do único anão de Devilon".

 As estradas de pedras irregulares incomodavam o rei. Mesmo em fortes distantes de Tyrun tal descaso funcional com o elemento era de embrulhar o estômago. Por isso, a casa quadricular que encontraram parecia aliviar um borrão em seus olhos. O trabalho inteiriço da rocha, perpendicular com a discreta calçada elevada para evitar enchentes das ruas, e mesmo a adoção de detalhes em madeira para o telhado de talas ligeiramente projetadas fazer sombra na face leste da construção eram cuidados definitivamente anões.

 Mas o proprietário não era alguém que, em circunstâncias normais, o rei dos Anões gostaria de encontrar.

 Como se soubesse que o procurariam, ou uma coincidência na rotina dele, Gillibrand abre a porta pouco antes dos três anões se aproximarem. Ele sorri um pouco, vendo os três forasteiros patrícios. O anão era consideravelmente velho, com costeletas cheias e brancas como algodão, mas sem barbas. Também era calvo, mas ocultava isso com uma touca grossa e vermelha. Sua túnica era adornada por um cinto que se pendurava em seu ombro e fazia vezes de condão para uma bolsa maior, no momento vazia.

 Mas um detalhe ignorado pelos vizinhos e conhecidos da comunidade humana de Devilon: Gillibrand era da linhagem Nibelung. Pode passar por décadas pelo escrutino dos circundantes, mas qualquer anão percebe imediatamente aquela condição. Aos olhos anões, as orelhas e o nariz eram muito amplos... Mas humanóides tinham percepção similar dos filhos de Tyrum, e não diferenciavam.

- Ora o que temos aqui... - sua voz era falha e rouca, trazia um pouco de humor, embora sua expressão demonstrasse que ele estava ciente da reação dos forasteiros. - Vocês podem não acreditar, mas é bom ver alguém como eu após tanto tempo...

- "Como você?" - Elger de Tyrun fala com certo desprezo. Houve algumas cismas ideológicas entre linhagens anãs no último século, mas nada como a dos Nibelungs. Eles se aliaram ao Deus enlouquecido durante a Guerra da Magia.

- Devo deduzir que isto é o que? - Ele sussurrava, mas mantinha um ar divertido na voz. - Uma limpa genealógica? Eugenia? Alias... como me encontraram?

- Nunca perdemos você de vista. - Agora Volthrur quem falava. - Você em particular desertou da Tropa Dhizir 12. Não era um combatente..., mas jamais lhe demos confiança total!

Gillibrand olha para os lados e para os prédios próximos a sua casa, quase como se tentando adivinhar qual dos vizinhos era um espião de Tyrun ou do Castelo de Ferro. Mas sem muitas pistas, volta para o trio.

- Eu preparei geleia e conserva de cogumelos. - Fala ele com leveza, dando as costas ao grupo e fazendo como se fosse entrar de volta à sua casa. - Se viessem alguns dias mais tarde, no período da colheita, teriam uma recepção mais farta... Mas não creio que irão reclamar ...

- Nós não viemos para um banquete... - Elger adianta-se e estende a sua mão ao ombro do nibelungo. - Você tem que responder a...

 A mão veloz de Volthrur detém a do príncipe poucos segundos antes dele agarrar as túnicas de Gillibrand. O nibelungo cessa seu caminhar em silêncio, olhando por cima do ombro. O príncipe fica paralisado em choque com a reação do capitão, e então percebe o porquê.

 A mão encoberta de Gillibrand crepitava com uma energia escarlate. Gillibrand era um mago, um ser raro na época, ainda mais na raça anã, e o que quer que ele tivesse preparado, vitimaria o agressor sem dificuldade.

- Cessem as hostilidades! - Thrummaz ordena, como só um rei o poderia. Ele descobre a peça de ouro que trazia sua flâmula e ostenta-a ao mago. - Tyrun tolerou sua existência porque, a despeito de sua linhagem, não agrediu a lei dos anões e a lei dos Deuses. Agora, Tyrun vem a você buscando um pouco mais que sua omissão, mestre Gillibrand de Skelos.

 Gillibrand suspeitava da identidade do rei, mas não tinha certeza. De qualquer forma, aqueles três conseguiram sua atenção. 

- O que poderia alguém como eu auxiliar, ó emissários de Tyrun?

 Thrummaz meneia a cabeça na direção da carroça. Volthrur sobe nela, e usando as cobertas, mantém oculta, mas posicionava o artefato de pé. O mago caminha desconfiado até o volume. Ele levanta um pouco o pano, expondo brevemente a base e o pé do artefato. Como se confuso, observava o contorno das mantas, medindo e certificando-se da altura da estátua, embora jamais visse completamente.

- Onde acharam isto? - Pergunta o nibelungo.

- Em um lugar menos que honroso. Basta saber disso... - fala o Príncipe. - É uma pobre amaldiçoada pela magia de sua linhagem.

- Isso não é uma maldição. Talvez seja... Não necessariamente. - Ri Gillibrand, cobrindo cuidadosamente os pés do artefato, como se entendesse o motivo do sigilo. - Essa é a “Concha Púrpura” . Um mago pode lançar sobre si mesmo, como último recurso. Dentro da Concha, o tempo passa devagar. A carne que se torna rocha é quase que indestrutível. E, por fim, há sempre um gatilho.

- Gatilho? - Exclama Volthrur.

- Veja... - Gillibrand começa a enrolar a manga de sua túnica, até expor a pele abaixo de seu braço, mostrando uma tatuagem de cor similar à do artefato. - Não é uma magia tão secreta, ao menos dentre os Nibelungos. E antes das grandes cismas, quando Nibelung trabalhava por Fórgia, podíamos ter presenteado pessoas importantes com a marca ou uma varinha preparada. Se nossas vidas estiverem em perigo, acionamos a runa da “Concha Púrpura” e esperamos o gatilho ser acionado.

- Você falou de "gatilho" de novo! - Reclama Elger.

- Oh, perdão... - O nibelungo parecia mentalmente confuso. - Varia de situação. Gatilho é um termo para uma previsão de acxionamento ou cancelamento de um encanto. O mais tradicional é quando a estátua é encontrada por outro anão... E que este não queira mal ao protegido, a Concha se desfaça.

- Está dizendo que ... A pessoa presa nesta forma fez isso espontaneamente? - Thrummaz se espanta.

- Não disse isso. - Censura o mago. - Para uma corruptela na magia a tornar uma maldição contra a vontade, é consideravelmente simples. Mas se soubermos o gatilho que abre a Concha, ela volta a vida como se tivesse um sono de pouco mais que horas ao invés de séculos.

- Ela não despertou quando nós a encontramos... - pondera Thrummaz. - Devo supor que o "gatilho" comum não é o caso. 

- Isso pode ser um problema... - ri o mago. - Só quem conjurou saberia qual o gatilho adequado. Pode ser uma palavra mágica, uma peça específica... um indivíduo em particular... E se o conjurador for mais criativo que eu, pode ser algo que eu não descobriria nem abstraindo.

- Então... a pessoa está perdida na rocha? - Thrummaz pergunta, temendo a resposta.

- Talvez não. - O anão esfrega as sobrancelhas ralas. - Tenho algumas alternativas em mentes. Não agradáveis, mas... se libertar esta pessoa é importante para vocês, creio que até tolerem o preço...

- Senhor... - Volthrur debruça-se sobre o ouvido do rei Thrummaz. - O que quer que seja, aqui na rua não é o melhor lugar para nos determos... Ainda mais com emissários aurianos nas proximidades.

 O rei concorda discretamente.

- Nosso abrigo fica no pomar fora da cidade, mestre Gillibrand. - Fala o rei. - Poderia nos acompanhar até lá?

- Pelo contrário. - Fala o Mago. - Tudo o que preciso está no meu porão. Precisarei de coisas do meu sótão... e sou um velho frágil. Vocês, mais vigorosos, levem a estátua ao círculo rúnico do porão, e eu em breve os encontrarei.

A ►Parte 3 talvez já esteja online!

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