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21 de fevereiro de 2018

[Conto] Thrummaz - o Rei Anão - Parte III

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► Veja a Parte II


 Gillibrand desapareceu por uma escadaria para o piso superior, enquanto os três anões carregavam a petrificada Ynahum Thyrin por uma estreita mas firme sessão de degraus para o Sótão. A escuridão completa não atrapalhava os anões, senhores das cavernas e dos submundos. Podiam distinguir facilmente o círculo descrito no meio de um calabouço transformado em biblioteca arcana consideravelmente ativa. As paredes eram forradas por móveis de madeira que ostentavam livros, pergaminhos, tubos de vidro, peças de laboratórios, e uma discreta alcova com bigornas, uma fornalha de carvão mineral, e um martelo apropriado para pequenas peças.

 Volthrur e Elger aprumavam a estátua de forma a manter o respeito pela sacerdotisa, enquanto Thrummaz subia ao plano térreo. Ele ouvia cascos de cavalo, e se preocupava.

 Magistrado Kype regressara. Faz uma pesada reverência. Algo pesava em seu semblante.

- Coronel Dyomaz dispensou os emissários aurianos. - Fala ele. - O coronel está ciente de Vossa presença e deseja compensar a ofensa com um banquete em Vossa honra, majestade.

- Más notícias nas conversas com o Império? - Thrummaz arrisca.

- O Coronel decidiu rejeitar a oferta. - Fala enfim o magistrado. - Quase certo que a próxima visita não será a de diplomatas, mas conquistadores.

 Thrummaz imaginava que o coronel, àquela altura da vida, iria aceitar ser anexado ao Império Áureo. Estava genuinamente surpreso pela decisão, e temia que sua presença na cidade-estado era uma assertiva de dissuasão. Devilon era longe demais para receber reforços dos aliados de Lyon sem ser algo ostensivo. Mas após a Grande Guerra de Donaire o coronel, um veterano da batalha, tornou seu castelo um ponto seguro para os refugiados e os colonos. E teve sucesso em proteger o que viria a ser Devilon por todos aqueles anos... 

- Serei honesto, caro primaz... - fala o rei com ritualística apropriada. - Esta situação de sua nação foge a minhas expectativas. Não farei a afronta de não me apresentar a seu regente, mas...

- Eu entendo. - Interrompe o magistrado. - E eu ouso dizer que aconselhei que o coronel aceitasse a anexação. Não por objetivar afrontar Tyrun ou nossos vizinhos ocidentais, mas estamos na era dos Grandes Reinos. Murar uma cidade é forma antiquada de governo. A decisão de nosso coronel foi mais por ideologia e orgulho do que visão política.

- Por isso eu aprecio tratar com os devotos do Deus da Justiça. - Thrummaz afirma. - Vocês são respeitosos, mas não hesitam em falar o que pensam com sinceridade genuína. Mas devo dizer que eu não... posso me dar a este luxo. Seu regente deve ter coisas a ponderar esta noite. Eu o buscarei amanhã formalmente. É uma promessa.

 O magistrado entendia que estava sendo dispensado. Era uma situação estranha, mas não sabia o protocolo adequado de confrontar um rei. Preferiu dar as vezes aos desejos de Thrummaz e partiu. 

- Até que enfim. - Urra alguém no sótão. - Achei que ele nunca iria embora!

 Gillibrand posava de um anão velho e fraco quando se encontrou com o rei. Mas agora parecia outro... parecia um fantasma do passado.

 Ele usava uma placa peitoral formal, com adornos no ombro indicando divisas dos magos de Batalha de Skellos. Suas pelugens estavam razoavelmente aprumadas dando um ar de elegância ao idoso. Quando muito jovem, Thrummaz viu guarnições com aquele mesmo uniforme, e temeu por sua raça. 

- Sei que eu fui "perdoado" por ser um desertor, Majestade... - o nibelungo reforça a qualificante para confirmar que sabia com quem tratava. - Isso porque meus superiores eram eugenistas tolos e não tinham escrúpulos em mentir e distorcer para aliciar as fileiras. Mas Donaire trazia poder e propósito para os meus. E se não fosse eu não poder conviver com a mentira, estaríamos em lados inimigos da guerra como era o destino.

 O desabafo deixa o rei sem palavras. Por um instante, imaginava que o mago iria erguer as mãos e conjurar bestas além-planos para o trucidar. Mas do nada, um sorriso amigável surge no velho nibelungo.

- Agora, vamos aos negócios, sim? - Fala ele, descendo os degraus de rocha e encorajando o rei a segui-lo.

(...)

 Thrummaz não vê quando o Nibelungo realizou o primeiro feitiço, só percebe fagulhas azuis-escuros rodeando a estátua. Ele preparava outro gesto intrincado com murmúrios quase inaudíveis.

- Por que não tira essa armadura para lançar seus encantamentos?

 O mago ignora a pergunta do príncipe. Termina a conjuração que torna as fagulhas uma única bola de energia de cor púrpura, a qual parecia estimular a estátua a brilhar mais.

- Os Nibelungos possuem técnicas mais refinadas de magia. - Fala ele. - Armaduras e escudos não nos atrapalham em nada. Isso nos fez valiosos na Guerra.

- Gillibrand eu não autorizei o senhor a começar nada. - O Rei dos Anões observa com autoridade. - Especialmente depois dos seus avisos! Explique o que está fazendo e só depois de nós concordarmos, poderá continuar.

- Tudo bem... - o mago parecia uma criança hiperativa sendo obrigada a parar de brincar. - Eu disse que, maldição ou proteção, a “Concha Púrpura” tem um gatilho para desfazer. O problema seria conhecer este gatilho.

- Sim, nós entendemos até esta parte. - Elger intervém.

- Pois eis a decisão... - fala o mago. - É possível que eu possa tirar a Concha. O problema é: Como o encantamento já está ativo, terei de lança-la em alguém. Seria como um "transplante". 

- Lançá-la?!? Em quem?

- Qualquer um... - fala o mago. - Um transeunte, um de vocês.... Eu mesmo, embora já declare que não aceitarei.

- E ela ficará presa na maldição sem conhecer o gatilho?

- Para não dizer que só trago más notícias... - O Nibelungo novamente despe o braço, mostrando a própria runa tatuada. - O encantamento passará por minha runa, então adotará o meu gatilho, o qual eu sei qual seria. É uma situação mais agradável que a atual.

- E qual é... exatamente... o seu gatilho. - Thrummaz começava a desconfiar do mago. Algo o incomodava.

- Meu gatilho é o padrão.... Ser encontrado por um anão que não me queira mal. 

- Mas isto é fácil. - O príncipe Elger sorri. - Nós três respeitamos um ao outro, daríamos a vida por...

- Não é tão simples, alteza. - O mago interrompe. - Imagine que eu esteja cercado por pessoas que eu confie, mas que me traiam. Num último esforço de sobreviver, eu ativo minha runa. Me aprisiona, mas me permite a proteção de meus circunstantes.

- Eu... Não entendo... - Volthrur confessa a confusão.

- O alvo de minha concha precisa ser ENCONTRADO. Palavras são importante na magia. Vocês todos, e eu também, podemos ser ameaças ocultas. Por isso, o gatilho não funcionaria conosco, que temos consciência da Concha. Nem com nossos agentes pessoais ou a quem falássemos livremente sobre ela. O ideal é largarmos num local ermo e esperar que um anão incauto, mas honrado, o encontre. 

- Isso pode levar anos! - Protesta o príncipe. - Esta burocracia é mesmo necessária?

- Eu faria isso sem hesitar se achasse que minha vida está em perigo. - Fala com certo humor o mago. - Seria um último recurso, mas preferível à tortura ou à destruição. E antes que tenham alguma ideia: Posso acionar a minha runa quando eu quiser, e ao invés de libertar a sacerdotisa, terão duas estátuas em suas mãos. Isso se eu não matar algum de vocês antes de me fechar.

 - Majestade... - o capitão Volthrur se adianta. - Não há honra se usarmos de nossos anfitriões Devilonos, ainda mais inesperados. Por isso, eu me voluntario.

 - Espere, capitão! - O príncipe protesta. - Há outros soldados da...

 - Quanto mais pessoas souberem da condição do gatilho, menos chances temos de que um anão genuinamente bom encontre a estátua. E talvez até mesmo a  “Malho de Cobre” possa auxiliar. A magia é antiga, ela pode ter convivido com esta situação.

 - Volthrur está certo... - Gillibrand acena continuamente enquanto o capitão falava. 

 - Pai, eu sou o Príncipe de Tyrun. - Afirma Elgen. - Os herdeiros da Forjadora deveriam se encarregar da missão. Tenho dois irmãos, um deles mais velho, que cumprirá adequadamente as funções sucessórias. Permita que eu...

 - Nem OUSE! - O rei urra repreensivamente. - Com pesar no coração eu vejo que o capitão é a escolha mais adequada. E terá a eterna gratidão do Trono.

 - Pai... - insistia o príncipe. - Vamos abrir mão de um honrado...

 - Meu filho... - Thrummaz põe as duas mãos sobre os ombros do príncipe. - O Império Áureo marchará sobre Devilon em muito breve. Preciso que você junte um terço da Khro Rym. O terço mais rápido e discreto que puder, e parta a Tyrun. Alerte seu irmão, que deverá reger até eu retornar. Alerte nossos aliados, e que eles decidam pela diplomacia ou pelas armas. Eu e Ynahum Thyrin podemos ter outras paradas, mas retornaremos. E jamais fale o que ocorreu aqui a mais ninguém. Mesmo às cortes. E especialmente à família real.

 - Eu entendo, pai. - O príncipe não mais protesta. Ele abraça longamente o capitão, e parte carregando todos aqueles segredos.

 - Capitão Volthrur, queira postar-se atrás da estátua. - Fala o mago. - E saiba que eu admiro sua coragem e predisposição. Mesmo esperando que o rei fosse ... Esqueça.

 - Só faça o que for necessário. - Rosna Volthrur. Sua vontade era inabalável, mas o nervosismo era inevitável.

 A composição era o oficial detrás da estátua, com o mago nibelungo à sua frente. Mantinha a esfera de energia que conjurou antes à altura dos olhos da estátua.

 A dúvida retorna ao regente. Ele lembra que o Nibelung observou os pés da estátua - onde estavam as runas -; Não participou do posicionamento do artefato - coisa estranha para um ritualista -; E perdeu por alguns segundos o que quer que o mago fazia. Aquele show pirotécnico antes de explicar os segredos da “Concha Púrpura” poderia isolar a estátua?

 - Volthrur... - fala o rei. - Gillibrand chegou a tocar na estátua?

 - S...Sim, meu rei. - Fala o capitão nervoso. - Digo, não, mas estava no ambiente. Digo...

 - Que a forjadora me perdoe por pensar isso... - fala o rei. - Mas e se Ynahum Thyrin usou o "gatilho comum"? E se ela não se sentia segura com os filhos de Tyrun? Com os herdeiros de Forjia?

 - Então, majestade... - Gillibrand fala com uma rizada débil entre os dentes. - Ela se sentiria à vontade diante de um Devoto de Donaire, o Deus legítimo da Magia!

 Antes de qualquer reação, Gillibrand desfaz o teatro. Ele toca o peito do artefato, e estende a mão espalmada, de onde uma esfera rubra com a runa idêntica à tatuagem brilhava mais incandescente. A esfera vai na direção de Thrummaz, e não de Volthrur.

 Dalí, tudo correu de forma lenta. O Rei dos Anões sentia seu corpo frio e duro. Irradiando do peito, e em segundos suas pernas estavam rijas. Via a Sacerdotisa dar uma golfada profunda de ar e ligeiramente se ver livre. Volthrur partiu com machado em riste contra Gillibrand, mas um escudo projetado da armadura do nibelungo amortecia boa parte do golpe.

 Queria lutar. Sacar seu martelo e apoiar seu capitão, mas seus olhos ficavam semiopacos. Os lutadores eram vultos agora, e mudavam de posição tão caoticamente que o rei não sabia quem era o capitão, quem era o traiçoeiro Nibelung.

 E então, A recém revivida Ynahum Thyrin golpeia alguém com seu malho de cobre. Uma luminescência interrompe a luta.

 Dois estavam lá, diante da estátua do rei. Ele não podia ver ou ouvir, mas de uma forma estranha, podia sentir.

 Mas depois disso, sonhos sem sentido tomavam sua mente. Distraíam-o mas não permaneciam na memória muito tempo. Como se fossem dois ou três minutos de delírio, e a gravidade finalmente volta. O Rei dos anões sente seu corpo cair ao chão.

- Eu fa-fa-falei que e-ele iria que-quebrar! - Fala uma voz com gagueira, mas com confiança. 

- Eu só toquei nela! - Outra voz, mais próxima e firme, embora urrasse em defensiva, retruca.

 Era um lugar iluminado, como um templo a céu aberto. A visão turva de Thrummaz viam quatro vultos, Um deles, uma mulher alta, envolvente e esguia. Algo em sua mão emitia de tempos em tempos labaredas rubras que dançavam em seu braço.

- É... A Forjadora.... - Fala o rei delirante. - Hannah, eu achei você.

- Oh, que bonitinho! - A mulher ajoelha-se e se aproxima do anão caído. - Ela acha que eu sou sua deusa, Tholen! - Era uma humana usando vestes leves. Thrummaz estava certo após segunda análise que ela poderia ser qualquer uma, menos a Forjadora.

- Um nobre reconhece outro. - Fala o último do quarteto. Um homem esguio com pouca armadura fora vestes de viagens verdes, mas com armas embainhadas à mostra. - Senhor, eu sou Geen Nobunada, Hatamoto de Wen-ha. O senhor está fora de perigo.

 Thrummaz recompõe-se, ainda com sentidos abalados.

- O senhor falou Wen-ha... - comenta o rei. - Perdão eu desconheço esse nome...

- Co-como assim? - Protesta um muito jovem próximo a Nobunaga com semblante semelhante ao nobre, aos olhos do rei anão. - Wen-ha éé-é um dos gra-grandes re-reinos! Que no-nobre dedesconhece nosso reino?

“Grandes reinos”. A fala do magistrado Kype vem à mente do rei. 

- Um nobre que era nobre antes de Wen-ha se revelar ao continente. - Thrummaz era treinado. Sabia quando um intruso tentava ler seus pensamentos, mas a humana o pegou em um lapso momentâneo de fraqueza. - Um nobre com uma mente de concreto, ouso dizer. - espanta-se a humana.

- Eu exijo... que.... - Thrummaz tentava dar ordens e impor seu título, mas eventualmente admite a si mesmo que era o menos consciente naquele momento a tomar ordens. - Perdão.... Eu estava preso, e devo ter sido solto por um anão que...

 Enfim, ele centra os olhos em um ser de estatura próxima à sua. Usava armadura pesada e uma longa barba - que o incomodou. Mas era um anão, o único que poderia ter o libertado.

- Mas você é um anão de Dol'oan! - Exclama surpreso o Rei.

- Sou o Viajante, meu caro. - Fala o anão, como se aquela alcunha bastasse. Ele parecia rústico, mas desconcertantemente animado com a visão do rei. - Sou Tholen da Torre do Martelo.

- Como Therin ... - lembra o rei. Tinha encontrado fazia poucos dias, em sua perspectiva. - Apesar de nossa diáspora, eu não sou seu...

- Você conhece meu avô? O Fundador de Dol'oan?!? - Tholen sorri. – Fale mais, veterano! 

- O que e-e-ele fez com no-nosso anão? - Estranha o infante de vestes verdes, tatuagens e cabelos espetados. - Nu-nunca vi Tho-tholen sorrir a-antes!

- O anão gosta de encontrar outros como ele, Midori. - Comenta Nobunaga, apresentando uma bota de bebida ao rei.

- Tholen... - a humana adianta, apontando sobre os disfarces. - Ele usa uma flâmula muito antiga. Eu não a reconheço, mas já vi paródias delas em velhas casas anãs. 

- Eu sou eternamente grato a vocês. - Fala o regente, aceitando a bebida, uma agua ligeiramente azeda que talvez tivesse álcool, mas jamais bastante para impressionar um anão. - Não sei o quanto meu nome vale hoje... Mas eu sou Thrummaz de Tyrun, rei dos anões.

 O trio de humanos se entreolham, e depois encaram Tholen.

 - É uma honra ter o reencontrado, majestade. - fala o anão, com pesar na voz. - Mas creio que após quatro séculos, o senhor é rei de nada.


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